Chovia como se as nuvens chorassem as dores de todos os que sofriam no mundo. A terra molhada enlameava os pés dos tantos que próximas a um caixão demonstravam todo o seu respeito aos falecidos. Raquel, em seu vestido preto, segurava suas lágrimas enquanto acompanhava filho e marido seguirem para outra realidade...
Dois dias antes
Rogério dirigia em um passeio com a família. Marcelinho e Raquel dormiam em seus acentos. Em uma tarde de muitas distrações a família retornava para casa. Em um ponto da estrada um sinal de transito, semáforo em cor vermelha, assinalava parada obrigatória. Rogério parou o carro, olhou para traz e viu o seu filho em sono profundo, olhou para o lado e lá estava sua esposa. Quando Rogério tentou olhar novamente para a estrada ele sentiu em seu rosto o frio do aço de uma arma: - Perdeu bacana! - Rogério se assustou, instintivamente pisou forte no acelerador. O marginal desferiu três tiros...
Tempo atual
Raquel começou a caminhar para o seu carro. Vários parentes a consolavam. Prestavam apoio e se ofereciam para uma eventual necessidade. Agradecida ela continuava o seu caminho para a solidão. Ao entrar no carro percebeu que existia algo em seu acento. Pegou o pacote e jogou para o lado.
Depois de algumas horas o retorno ao lar, agora vazio, sem a alegria de seu filho. Observou o sofá da sala e lá se encontrava alguns brinquedos jogados. A tristeza então chegou forte e dominou a mente, corpo; tudo parecia desabar, toca o telefone:
- Alo. – Falava Raquel ao telefone, entre soluços e lágrimas.
- Volte para o carro e pegue o pacote! Raquel ficou surpreendida, uma voz ríspida, masculina, agressiva se anunciava.
- O que?
- Desculpe, não se assuste. A janela de seu carro estava aberta e então jogamos um envelope para dentro. Diz respeito ao seu marido, ao sair de casa não esqueça o seu celular.
Assustada com o teor da ligação corre para fora de sua casa em direção ao seu carro, carregando o seu celular. Ao chegar próxima ao carro percebe que não trouxera as chaves, o seu celular toca:
- Não precisa voltar para casa, escute com atenção. Ao lado de seu carro você vai encontrar um calço de madeira em forma de cunha (tipo aqueles que você usa para impedir que uma porta bata com o vento) e uma vareta de metal comprida. Para começar, calce o arco da porta do motorista até conseguir uma pequena fresta. Depois insira o arame/vareta pela fresta e puxe o pino da trava. – Raquel seguiu as instruções e abriu o carro, mas ao entrar lembrou-se das chaves e gritou ao celular:
- O que adiantou sem as chaves!
- Pegue a cópia no porta-luvas.
Depois de pegar a cópia das chaves pegou o envelope, saiu do carro, clicou no alarme trancando as portas do carro e foi para casa. Ao chegar frente à porta percebeu que estava trancada, novamente toca o seu celular:
- Debaixo do tapete de sua casa você vai encontrar dois mecanismos. Um é reto e você deve colocá-lo na parte debaixo da fechadura, o outro é serrilhado e você deve esfregar na parte de cima ao mesmo tempo em que empurra a porta para dentro com o ombro.
Não demorou muito e a porta se abriu. Ansiosa, curiosa, sentou no sofá, abriu o envelope e começou a ler com toda a atenção. No final da leitura ela se jogou no encosto da poltrona. Olhava deslumbrada para o teto de sua casa, seus olhos giravam como se estivesse fora de suas orbitas. Toque de celular:
- Agora você sabe, pegue os dois frascos e com muito cuidado coloque em sua bolsa. Esta anoitecendo e você deve voltar para o seu carro e seguir para a rua que você leu no envelope. Estarei com você o tempo todo. Agora vá!
Duas horas se passaram. O carro de Raquel parou em um estacionamento público. Sorrateiramente ela desceu de seu carro. Com o celular no ouvido seguiu até outro carro, pegou o calço de madeira, a vareta e abriu o carro. Esticou a mão até chegar à alavanca do porta-malas. Puxou a alavanca destrancando o porta-malas, fechou o carro, entrou no porta-malas tomando o cuidado de colocar um pedaço de papel na fechadura para não deixa-lo trancar e aguardou.
Dez horas da noite e o carro começou a andar. Raquel se assustou, mas segurou a sua ansiedade. Seguindo exatamente as orientações do homem ao celular esperou o tempo do carro, com o motorista, chegar até a sua residência, mais quatro horas para ele dormir e saiu do porta-malas.
O proprietário da residência mantinha o automóvel em uma garagem coberta. No fundo da garagem, dando acesso ao interior da casa, uma porta. Raquel chegou até a porta, pegou a ferramenta que utilizara para abrir a porta de sua casa para abrir a porta da garagem. Entrou lentamente na casa a partir da cozinha. Procurou entre os mantimentos o pote de pó de café. De sua bolsa retirou os frascos que recebera e colocou o seu conteúdo no pote. Pelo mesmo caminho que entrou na casa saiu, com a preocupação de fechar a porta da garagem e entrar no porta-malas com o cuidado de não deixá-lo trancar.
Um barulho de fechar de portas acorda Raquel. O automóvel começa a se movimentar. Depois de algumas horas, ou minutos, percebe que o veiculo para. Duas horas de espera até descer do porta-malas, tranca-lo e se arrastar até o seu carro. Um suspiro, muito choro até adormecer.
A noite chegara ha algumas horas. Trancada em seu carro desperta socando em sua volta. Rosto suado, tentando acreditar no que ocorrera liga seu carro e dirige para sua casa.
Próxima a sua casa um carro estacionara. A cor, modelo, placa não deixavam dúvida, era o carro que passara longas horas no porta-malas. Pequenas trepidações em sua face mostravam que estava perdendo o controle de suas faculdades. Desceu de seu carro, caminhou lentamente para a sua casa. Observou que a porta estava aberta, entrou. Toda a casa estava escura menos a cozinha. Em uma cadeira frente a uma mesa uma mulher de seus um metro e setenta, olhos castanhos de roupa de ginástica a esperava, foi a primeira visão que teve ao chegar na cozinha. A frente da mulher se encontrava uma arma. Ela se levantou e seguiu até a pia, se voltou para Raquel e em tom bem alto lhe falou:
- Eu matei seu marido e seu filho.
Raquel ficou desorientada, começou a olhar para a arma sobre a mesa. A bela mulher começou a insulta-la; gritava e comparava sua família a vermes.
Não demorou para que em um pulo a arma fosse empunhada. Com a mão tremula desferiu um tiro, depois outro e o recuo da arma fez com que ela batesse na cabeça de Raquel a jogando para o lado com os olhos fechados. Lentamente ela abriu os olhos, a sua frente à bela mulher sorria:
- Quem matou a sua família breve estará morto. A arma estava carregada de munição festim. Eu sou o seu mentor!
Dois anos se passaram
O telefone toca: - Alo.
- Volte para o seu carro. Lá você encontrará um envelope que fala sobre seu irmão.
Marcelo desliga o telefone, cobre o rosto e chora compulsivamente. Do outro lado da linha uma voz carinhosa fala ao ouvido de Raquel: - Muito bem pupila.
Fim...